A Madeira caminha para uma situação de grave conflito social. Penso que poucos duvidarão. Há um conjunto de factores que dia-a-dia se conjugam em completo desacerto com o discurso oficial. Ao mesmo tempo que, aos olhos de todos, a crise, que não é de agora, instalou-se e agrava-se, o discurso político continua a despachar para fora os problemas que são de cá de dentro.
A intervenção política do presidente do governo no recente jantar-comício na Ponta do Sol, provou isso mesmo. Ali, na Ponta do Sol, a avaliar pelas palavras ditas, não há problemas para resolver, a agricultura em geral está resolvida, o concelho cresce, não há problemas sociais, há um bem-estar de causar inveja. Por isso, o discurso foi todo ele dirigido para o inimigo externo, para a República, como se o governo regional não existisse. Daí os disparos: "a Madeira está metida numa República que não funciona", há um "sufoco colonial" e abençoado povo madeirense que me diz "Alberto João aguenta-te e luta contra eles" porque a "Madeira está a ser roubada, discriminada", portanto, "temos de tentar pôr o Sócrates no olho da rua".
Ele pergunta e dá a resposta. A questão da boa ou má governação não está aqui, nos órgãos de governo próprio, mas sempre em alguém de fora, pouco compreensivo com a Madeira. Sempre foi assim. Há que anos é assim!
Só que, agora, o problema já não é apenas com os de fora, com a República, é também com os milhares que votaram e não concordam com estas orientações políticas. E para condicioná-los nada melhor do que utilizar a maioria que dispõem na Assembleia Legislativa da Madeira. É o Regimento que foi alterado para condicionar o debate, são os secretários regionais que, sucessivamente, não se apresentam na Assembleia para responder pelos seus actos políticos, é o presidente que foge da Assembleia como o diabo da Cruz, é a passagem dos projectos de resolução para o âmbito das Comissões Especializadas, estas, por sua vez, com um regimento extremamente condicionador da palavra, enfim, é, agora, a tentativa de colocar fora da Assembleia todos os partidos que não atinjam 5% de votos nos actos eleitorais. Mais. É a retirada da "confiança política" ao Representante da República que está atento ao desmando e, a juntar a isto, um vergonhoso "jackpot" para encher os cofres e gastar em monumentais campanhas eleitorais. Há, aqui, uma ideia de puzzle, onde todas as peças (internas e externas) estão a ser colocadas e que visam, no futuro, espezinhar e manter, sob uma capa democrática, uma ditadura da maioria de efeitos muito graves.
Seria bom que o governo regional, até 2011, final do seu mandato, governasse a Madeira em função das realidades e das necessidades. É isso que o Povo quer e é isso que a oposição deseja. Em 2011 logo se verá no acto eleitoral. Até lá está obrigado a rever comportamentos e estratégias políticas respondendo, sem manhas e subterfúgios, aos problemas da Madeira.
Estou certo que o Povo, não levará muito tempo, acordará desta anestesia, diariamente alimentada com novas doses.
4 comentários:
Senhor Professor
"...o povo acordará..."
Não estou tão certo que isso aconteça nos próximos tempos!
A "droga" é das pesadas,e vem sendo,continuadamente,injectada há mais de trinta anos!
Caríssimo,
Em 1974, dias antes da Revolução, a designada "brigada do reumático" reuniu-se com Marcelo Caetano prestando-lhe vassalagem. O Povo aplaudiu (tinha de aplaudir). Dias depois estavam na rua contra aqueles a quem deram palmas. E no dia 26 de Abril, como sabe, as duas principais figuras (Tomás e Marcelo) já estavam na Madeira a caminho do Brasil.
Não gostaria que houvesse convulsão social pelos caminhos que a Madeira está a percorrer, mas gostaria que a Democracia funcionasse, através do voto livre expresso nas urnas. É difícil, compreendo, mas pressinto que tal irá a acontecer. Para bem de todos nós e desta terra que, desinteressadamente, amamos!
Senhor Professor
O senhor é um homem de fé, ao contrário de mim que não acredito em milagres.
Trinta anos,em Democracia(note-se) de "vira o disco e toca o mesmo",corrobora a minha descrença.
Todos os ditadores, como Salazar e Jardim, sempre souberam explorar a psicologia das multidões.
Multidões que aplaudem,sempre,o Poder ou uma sua muito credível perspectiva(o fenómeno Humberto Delgado prova-o à exaustão).
De resto, não fora a Guerra Colonial(que feriu as famílias portuguesas - com os seus filhos, mortos e estropiados - e massacrou, com sucessivas comissões,os mais jovens Oficiais do Quadro Permanente)muito provavelmente, ainda hoje, perduraria a "democracia orgânica" do Estado Novo.
Neste sentido, Abril não teria acontecido e continuaria a ser a aspiração de uma minoria, Democrata, atenta à iníqua realidade socio-política.
No caso concreto da Madeira - contrariamente à realidade Açoriana - a "insularidade cultural", da sua maioria, tem tido, e mantem, um peso inamovível.
A "Madeira Nova",filha dilecta do Estado Novo, constitui a mais descarada forma de revanchismo que a ofensa, bronca e maioritariamente consentida...continua a aplaudir e a branquear.
Infelizmente, a crescente descredibilização, das Instituições Nacionais, não ajudam ao acordar em que, o Senhor Professor,deposita tanta fé.
À Oposição compete - assumindo a sua quota de responsabilidade - reflectir, seriamente,nos caminhos, até então, trilhados, e,corrigindo os seus próprios e persistentes erros,reencaminhar esta terra na senda da Dignidade.
Queira aceitar as minhas democráticas saudações.
Caríssimo,
Concordo consigo na análise que fez através do seu excelente texto.
Mas lá diz o Povo, que não há bem que sempre dure nem mal que perdure. É neste quadro que me posiciono no sentido de uma mudança que traga o desenvolvimento económico, social e cultural que anseamos. Penso que é possível pois esta máquina está velha e ferrugenta apesar do muito óleo que derramam nas hostes apaniguadas.
Respeitosos cumprimentos.
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