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segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

INCOMPATIBILIDADES


O exercício da função de Deputado, do meu ponto de vista, é incompatível com o exercício directo da advocacia, muito menos quando o Deputado, por via directa ou indirecta, acaba por prestar serviços ao Governo e ao Partido que o elegeu. Não é bom para o normal funcionamento das instituições e para a sua transparência.

É evidente que se trata de uma prestação de serviços muito específica que carece, em determinados momentos, porventura nos processos mais complexos, de uma colaboração extra. Não coloco isso em causa. O problema é quando se torna a excepção em regra. Vem isto a propósito do governo, segundo o DN de hoje, gastar cerca de meio milhão de euros com advogados externos, quando todos, ou quase todos os serviços do governo regional dispõem de Licenciados em Direito. Meio milhão é muito dinheiro. Não é, aliás, assunto novo, pois há muito que este assunto tem feito parte do debate político. Esta peça jornalística tem o grande mérito de condensar os valores e de identificar escritórios. E de levantar uma outra questão, precisamente, a inexistência local de um lei de incompatibilidades.
Ora bem, por um lado, sublinho, para que se dissipem dúvidas, que alguns casos podem merecer consultas a experimentados especialistas. Por exemplo, uma interpretação de natureza constitucional é natural que justifique uma auscultação tecnicamente mais especializada. O mesmo já não se pode dizer da "elaboração de uma minuta de resposta do dono da obra" face a uma reclamação apresentada. São dois casos diferentes. Para o último caso, lamentavelmente, o governo passa um atestado de incompetência aos seus próprios gabinetes jurídicos. Mas, tão grave quanto isso, é a relação muito próxima entre os advogados, os advogados-Deputados e o governo regional. Não me parece que esta seja uma trilogia aceitável, daí a necessidade de fazer separar as águas. Quem está no Parlamento não pode servir a dois "senhores" ao mesmo tempo. O exercício da função de Deputado, do meu ponto de vista, é incompatível com o exercício directo da advocacia, muito menos quando o Deputado, por via directa ou indirecta, acaba por prestar serviços ao Governo e ao Partido que o elegeu. Não é bom para o normal funcionamento das instituições e para a sua transparência.
É evidente que o Parlamento, enquanto instituição que legisla, precisa de Licenciados em Direito e reconheço, também, que se o salário não for adequado, o Parlamento acaba por ver sair os mais credenciados. Na área do Direito como em outros sectores e áreas de intervenção política, a qualidade não pode ser descurada. Torna-se necessário ter uma atitude política equilibrada. Mas esse é um aspecto, o outro é a de uma certa ou flagrante promiscuidade entre as duas funções, a profissional e a legislativa. Em circunstância alguma pode ficar no ar que alguém aprova de manhã para beneficiar à tarde. Muito menos quando a falta de transparência chega ao ponto da situação que serviu de mote a este texto, isto é, os mesmos que desempenham funções legislativas serem também os mesmos que elaboram pareceres. Torna-se, por isso, necessária uma rígida e sensata lei de incompatibilidades, porque, na expressão mais simples e na voz popular, não é possível cantar e assobiar ao mesmo tempo! Exige-se, por todas estas razões, a reforma do parlamento.
Ilustração: Google Imagens.

2 comentários:

Pica-Miolos II disse...

Senhor Professor
Tenho a certeza que o ilustre causídico dr. Guilherme Silva concorda, em absoluto, consigo.

André Escórcio disse...

Obrigado pelo seu comentário.
O que lhe posso dizer é que muitas vezes fico espantado com determinadas posições que o dito assume!