Cerca de 200.000 trabalhadores concentraram-se, em Lisboa, protestando contra as leis laborais. Há tempos foram 100.000 educadores e professores que, do País inteiro, vieram até à capital demonstrar o seu descontentamento. Trata-se, de facto, de manifestações que ultrapassam, em muito, a capacidade mobilizadora dos sindicatos ou de uma qualquer central sindical. Os trabalhadores estiveram presentes porque estão a sentir o agravamento das condições de vida. Eu compreendo o slogan, ora se compreendo, "Não a esta Revisão das Leis laborais! Vida e Trabalho para Todos". Compreendo-a a váridíssimos níveis, dos quais destaco dois: desde logo, o respeito que deve existir, entre empregadores e empregados, pelas regras históricas do trabalho. Ambos têm deveres e ambos têm direitos. E o que se verifica é que, paulatinamente, os mais elementares direitos dos trabalhadores, pela pressão junto dos governos, estão a ser sugados pela lógica devoradora neoliberal que está a semear instabilidade em todo o tecido empresarial. E enquanto uns, os mais fortes, consolidam posições e impõem o deus mercado que desejam, outros labutam nas margens com todas as dificuldades e consequências daí decorrentes (desde a precariedade ao desemprego). Mas também estamos a assitir, entre os mais fortes, a uma outra luta, qual delas a menos penosa, entre trabalhadores (sobretudo quadros médios e superiores) cujos horários de trabalho deixaram, na prática, de respeitar princípios que levaram 150 anos a construir. Trabalhadores que, mais do que um sentido de pertença à empresa, são espezinhados pela lógica de uma cultura de desempenho baseado na conquista de objectivos, homens e mulheres que trabalham horas a fio e muito para além do horário semanal e da recompensa justa, também aqui, com um extenso rol de consequências, concretamente, entre outros, no que se refere à ausência de apoio à família e aos problemas de saúde resultantes do empenhamento no trabalho triturador. Leio, hoje, no Público que 1/5 dos bebés são filhos de mães tardias. É apenas um sinal.
Esta forma de conceber a estrutura da sociedade e o mundo do trabalho têm de ser repensados. Estamos a chegar ao fim da linha e o desconforto já está a dar evidentes sinais de perturbação. As manifestações, por toda a Europa, são uma amostra do que aí vem. Ninguém suporta esta pressão, o desemprego e a fome. Pessoalmente, entendo que o mundo político, os areópagos do debate político, mais cedo que tarde, terão de rever e de impor medidas que travem esta lógica suicidária.
O Homem é muito mais do que alguns querem dele fazer. Em liberdade, o Homem não pode transformar-se no escravo dos novos tempos. São, por isso, necessárias medidas económicas e sociais que atenuem o efeito das conjunturas e das pressões. E essas medidas impõem um pensamento estratégico de desenvolvimento que tenha em atenção novos equilíbrios, subordinados a três dimensões inter-relacionadas: a dimensão económica, ligada à produção e distribuição dos bens; a dimensão social, que tem a ver com as condições de vida e com as desigualdades e a dimensão cultural, ligada, fundamentalmente, ao património num sentido lato, enquanto conjunto de capitais (capital social, económico, cultural e simbólico).
Se assim não acontecer, caminhamos no sentido da tragédia!
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