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segunda-feira, 27 de setembro de 2010

ASSOCIATIVISMO JUVENIL ESCOLAR E A INTENCIONAL DISTRAÇÃO DOS ADULTOS


Aos problemas de gestão e administração da escola, os de natureza burocrática e os de natureza pedagógica, juntar os da organização dos jovens, passou a constituir não uma oportunidade para educar mas uma ameaça. Esta constitui uma outra perversão do sistema educativo que não tem sabido potenciar a força interna da escola, que está nos jovens, para neutralizar as fraquezas da própria escola.


As associações de estudantes são de extrema importância. A vivência e a aprendizagem ao nível do trabalho associativo em equipa, a dinâmica organizativa, gestora e administrativa, a mobilização dos estudantes na dinamização de campanhas pelos hábitos culturais onde se integra, também, o desporto, constituem aspectos que têm sido descurados. Olho para o actual quadro e pela experiência de muitos anos de ensino, constato que existe um enorme peso institucional que tudo quer controlar, não deixando espaço para a experiência, criatividade e inovação. Tudo ou quase tudo aparece organizado pelos adultos, o que leva a que a oferta não seja construída com a participação dos estudantes. A oferta nasce verticalmente, como produto acabado.
Ora, isto gera o desinteresse e o abandono. É sintomático que não existe uma cultura no sentido da integração e da participação voluntárias, onde os professores surjam, por um lado, como catalizadores das iniciativas e, por outro, como agentes de supervisão em função da sua experiência de vida. Dir-se-á que falta uma atitude cultural de confiança, pelo que subsiste a ideia que os jovens não são capazes e, até certo ponto, irresponsáveis para tomarem nas suas mãos o poder de iniciativa.
É evidente que esta mentalidade mata o sentido de participação, quando um dos princípios do desenvolvimento é precisamente o da participação: ou as pessoas participam ou os processos morrem. Este quadro tende a agravar-se, desde logo, por duas razões essenciais: primeiro, devido a uma cultura centralizadora do poder instituído que gosta de saber quem lidera e a que força política pertence. Começa aí a castração da capacidade de intervenção livre. É a divisão da escola entre bons e maus, entre os da cor dominante e os outros; segundo, em consequência, porque se torna mais fácil controlar as iniciativas quando as rédeas se encontram nas mãos do poder institucional.
Trata-se de uma cultura muito idêntica à do Estado Novo. Nos anos 30 do século passado, recordo, a título de mero exemplo, a designada, por Lei, “mania do desporto”, fez com que surgisse a FNAT (Federação Nacional para a Alegria no Trabalho), hoje INATEL, precisamente com esse espírito, isto é, já que não posso impedir a iniciativa, controlo-a. Relativamente ao associativismo juvenil, escolar ou não, a leitura política é muito semelhante, pois o poder hegemónico sempre teve a tendência para um olhar felino sobre as organizações. Não é por acaso que, em tempos, alguém terá dito que o objectivo era dispor de uma célula partidária em cada turma. Esta perspectiva constitui um monumental erro educativo, simplesmente porque se aprende fazendo, participando, não apenas como intérprete, mas como co-responsável da actividade. É daí que se consolidam as experiências que, mais tarde, acabam por ter efeitos positivos complementares da formação académica. O instrumento da participação tem um valor incalculável na vida porque há sempre um transfere para novas situações. Ao lado das competências adquiridas no plano curricular devem juntar-se outras competências que, tarde ou cedo, a vida profissional reclamará. A participação ajuda na descoberta e na formação de líderes, na capacidade de gestão dos recursos humanos e gestão e arbitragem de conflitos, no desempenho burocrático, na capacidade empreendedora, na dinamização e controlo da actividade. A participação não pode ficar por uma comissão “ad hoc” para uma viagem de final de curso ou, grosso modo, pela música no intervalo das aulas. As dinâmicas associativas devem assumir um papel de fulcral importância no processo educativo.

Há uma escola em Portugal, a Escola da Ponte, onde, sobre os valores matriciais do projecto educativo, se destaca: “Como cada ser humano é único e irrepetível, a experiência de escolarização e o trajecto de desenvolvimento de cada aluno são também únicos e irrepetíveis. O aluno, como ser em permanente desenvolvimento, deve ver valorizado na construção da sua identidade pessoal, assente nos valores de iniciativa, criatividade e responsabilidade”.
O próprio projecto educativo da escola deveria, desde modo, contar com a participação dos jovens, uma vez que a eles se dirige. É assim que é feito em sistemas educativos sérios e com resultados. Só que isso implica, também, estabelecimentos com menos alunos e docentes habilitados com uma formação adequada para estruturarem e potenciarem, desde o 1º ciclo, as dinâmicas de uma juventude com sentido democrático, participativa e integrada.
Só que, infelizmente, não podemos ignorar a coexistência de uma atitude de alguma desconfiança por parte das direcções executivas. Aos problemas de gestão e administração da escola, os de natureza burocrática e os de natureza pedagógica, juntar os da organização dos jovens, passou a constituir não uma oportunidade para educar mas uma ameaça. Esta constitui uma outra perversão do sistema educativo que não tem sabido potenciar a força interna da escola, que está nos jovens, para neutralizar as fraquezas da própria escola. O sistema tem andado distraído relativamente a esta matéria, todavia, creio, intencionalmente. Um exemplo: fala-se da indisciplina que grassa nas escolas. Pois bem, há estabelecimentos de ensino cujo regulamento interno, o enunciado dos direitos e deveres, é gerado a partir do debate dos próprios alunos e homologado em assembleia de escola. Todos sabemos que aquilo que nasce de nós próprios tendencialmente é cumprido. Aquilo que é imposto sem a participação tende a ser violado. Diz a sabedoria popular que “o proibido é o mais apetecido”. A vida ensinou-nos isso, então, porque raio, não trazer esse conhecimento para a escola? As pessoas estão a se esquecer que os compromissos fazem parte do processo educativo. Dir-se-á que dá mais trabalho. Talvez. Mas, a prazo, estou certo que os resultados são melhores.
Um pouco por tudo isto que fui escrevendo ao correr do pensamento, julgo que as escolas deveriam despertar os alunos para a existência do seu próprio clube. O clube com regime estatutário próprio, nascido dos estudantes e para os estudantes, dinamizador de toda a actividade cultural e desportiva. É ali que se ganha o conhecimento, as dinâmicas do trabalho, o sentido organizacional, a capacidade de planeamento, o sentido de responsabilidade e a estimulação da comunidade escolar em múltiplas áreas de intervenção.
Há textos publicados sobre esta matéria desde o final dos anos 70, mas até hoje são poucas as iniciativas que se consolidaram. E as existentes são incipientes. Escrevi vários a partir de leituras que fiz e das  experiências que interiorizei, experiências com sucesso lá fora realizadas. Não tem havido interesse porque o sentimento que existe é que o associativismo gera ruído no clássico sistema organizacional. O poder prefere construir e oferecer o menu, numa receita do tipo pronto-a-vestir, quando a educação precisa de alta-costura e por medida. São os estudantes que devem ser os costureiros do futuro e não quem está sentado à secretária de uma qualquer secretaria regional. São os estudantes que melhor podem estimular os sentimentos de solidariedade, da cooperação, da autonomia e da criatividade, obviamente sob a supervisão dos professores. Só que esta supervisão não significa que os estudantes sejam apenas receptores e actores.
A terminar, quando o próprio Conselho Regional de Juventude, outra clássica força de bloqueio, tem uma composição escolhida a dedo político, que reúne, quando reúne, não para debater mas para confirmar o que o poder político deseja, enfim... está tudo dito.
Ilustração: Google Imagens.

1 comentário:

Espaço do João disse...

Meu carop amigo.
Parece-me bem que já em tempos fiz este comentário não sei bem onde.
Eu advogo actualmente que não devia de haver o Ministério fda Educação. Deveria existir o ministério da Instrução, e o magistério da educação. Quando a educação deveria ser dada em casa, os educandos deveriam receber a instrução nas escolas. Quando um prof. pede para os encarregados de educação comparecerem e, estes resolverem que é tempo perdido, atacarem os prof. ,maltratarem os colegas e os profissionais de acção escolar e, estarem no bem bom a beberricarem uma cervejola com os amigos, nada feito. Quando se ostracisam os prof. retirando-lhes todo o poder educacional, nada feito. Mais , muito mais teria para dizer, por hoje aqui ficamos. Um abraço solidário. João.