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sábado, 30 de janeiro de 2010

ESPECIALISTAS NA DESCONTEXTUALIZAÇÃO

(...) Não basta disponibilizar um microfone a um governante, pois torna-se necessário conhecer senão todas pelo menos algumas variáveis do que se está a abordar.
Acabo de seguir o Telejornal da RTP-M. Abriu com uma peça, requentada, sobre o insucesso e abandono da escola, onde a Região da Madeira, num estudo do INE, aparece na cauda das regiões do País. E a RTP-M foi ouvir, a solo, o Secretário Regional da Educação. Dois aspectos ressaltaram das suas palavras: primeiro, que a Madeira não trabalha para as estatísticas, pelo que, os alunos vão continuar a chumbar; segundo, que há uma proposta a circular que defende que os alunos não devem chumbar no ensino básico.
A proposta pertence ao grupo parlamentar do PS. Dita de forma intencionalmente apressada e descontextualizada, induz o ouvinte em uma leitura de processo absolutamente inverdadeira. Aqui ficam alguns pontos do Artigo 9º do referido Regime Jurídico do Sistema Educativo Regional:
1. No ensino básico, o processo de avaliação das aprendizagens dos alunos é de natureza contínua e formativa e a sua arquitectura, caracteriza-se por formas simples mas objectivas, centradas nas competências adquiridas, da responsabilidade do Conselho Pedagógico de cada estabelecimento de educação e de ensino, ouvidos os respectivos departamentos disciplinares.
2. Os alunos que demonstrem fragilidades devem ser, de imediato, objecto de intervenção em contexto de sala de aula. Se após essa aplicação de medidas compensadoras mantiverem fragilidades em uma ou mais disciplinas curriculares, obrigatória e imediatamente, beneficiarão de apoio acrescido nessas disciplinas.
(...)

7. Não há retenções no ensino básico, salvo casos devidamente estudados e fundamentados em relatório do Conselho de Turma, onde conste, circunstanciadamente, o desenvolvimento do processo à luz do ponto 2) deste artigo.
Ora, isto é substancialmente diferente que sublinhar que a passagem de ano é obrigatória e que, por essa via, se melhoram os dados estatísticos. Para além deste aspecto, o Senhor Secretário da Educação deveria saber que um aluno que repete um ano lectivo custa cerca de € 6.000,00 ao erário público e que é economicamente mais barato investir, precocemente, nos primeiros sinais de fragilidade na aprendizagem. É assim por essa Europa fora e sobretudo nos países que servem de referência. A proposta do PS, neste aspecto, não traz nada de novo. O que o Senhor Secretário não fala, porque não lhe interessa, é na deficiente organização do sistema educativo ao nível regional e ao nível de escola; não fala na infernal burocracia que despeja sobre os estabelecimentos de educação e ensino; não fala das carências sociais que por aí andam, isto é, na pobreza que se reflecte na escola; não fala do excessivo número de alunos por escola e por turma; não fala da falta de investimento por carências orçamentais; não fala das atitudes políticas desprestigiantes que estão a afectar a classe docente e com reflexos na aprendizagem. Destes assuntos não fala e eu sei bem porquê!
Uma nota final, desta feita, infelizmente, para a RTP-Madeira. Apesar de não constituir notícia, o tema não deixa de ser importante. Daí que o contraditório se justificava, quando, no caso em apreço, foi "atacado" um projecto legislativo apresentado por um partido da oposição. Ouvir, unilateralmente, não me pareceu correcto, pelo que ficou a RTP, deste modo, com uma imagem muito pouco consentânea com o dever de isenção. Depois, julgo eu, não basta disponibilizar um microfone a um governante, pois torna-se necessário conhecer senão todas pelo menos algumas variáveis, as mais importantes, do que se está a abordar. Trata-se, apenas, de um desabafo, porque não brinco com a EDUCAÇÃO. É demasiado sério este sector para "partidarites". É um sector muito complexo e sensível do qual depende o nosso futuro colectivo.
Ilustração: Google Imagens.

2 comentários:

Telespectador disse...

Sr. Deputado
Já o ouvi taaaantas vezes na RTPM a falar da sua proposta...
É muito pouco leal, da sua parte, esta nota sobre a RTPM. Cada vez que vai falar com alguém sobre o seu projecto a RTPM vai atrás. Seja verdadeiro e agradecido.

André Escórcio disse...

Obrigado pelo seu comentário.
É provável que não tivesse sido claro. Nas últimas semanas percorri várias escolas e sindicatos para abordar uma legislação que reputo da maior importância. A comunicação social acompanhou-nos em três momentos, é verdade. Mas o problema não está aí. O Senhor Secretário tem tantas visitas a escolas, disserta sobre os mais diversos temas e eu nunca assumi qualquer crítica. É livre de o fazer no desempenho da sua missão governativa. Quando não concordo aproveito uma oportunidade e situo um dado problema. Olhe, através das Cartas do Leitor do DN, por exemplo.
Se o fiz desta vez foi por uma simples razão: o Senhor Secretário abordou questões faltando à verdade, iludindo os espectadores tal como demonstrei no meu post.
Aliás, que fique claro, uma coisa é um grupo parlamentar convidar os meios de comunicação social, outra, é a comunicação comparecer ou não. Isso já depende da oportunidade e dos critérios de cada chefia de redacção. É assim que eu penso. Defendo que a CS não tem de ir a todas!
Por isso, nunca pressionei nem comentei. Agora, no caso em apreço, uma peça de muita importância, pressuponho da iniciativa da RTP, deveria ter a preocupação de uma abordagem séria (o essencial, porque se trata de um telejornal) ouvindo outros interlocutores. Mas quem disse que deveria ser eu a falar? Porque não o PCP ou o CDS-PP ou o BE?
Mais, a comunicação social pede-me, com regularidade, colaboração e muitas vezes agradeço e declino. Não luto por "aparecer". Não preciso disso.
Penso ter esclarecido.
De qualquer forma, obrigado pelo comentário.