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terça-feira, 19 de janeiro de 2010

"ROUBALHEIRA"

Não é a primeira nem será, certamente, a última. Hoje li mais esta pérola do Senhor Presidente do Governo Regional: "À excepção do jogo Nacional-Werder Bremen, esta época não pus os pés no futebol. A ideia que tenho, é a de que se trata de uma roubalheira montada".
Desde logo defendo que um político, com responsabilidades governativas, deve manter-se distante desta monumental embrulhada que o futebol, sobretudo o de natureza profissional, genericamente envolve. Penso ser um bom princípio. A responsabilidade de governar que implica tantas e penosas preocupações, não deve descer ao nível da conversa de café, onde fervorosos adeptos, entre uma "milhada" e um copo, desferem os comentários mais grotescos em defesa das suas cores. O exercício do poder encerra, do meu ponto de vista, cuidados com a linguagem e com o efeito multiplicador do sentido das palavras ditas. É tão insensato alguém falar da "roubalheira montada" no futebol como falar da "roubalheira montada" no governo. Não faz sentido, é abusivo e excessivo até porque há instituições próprias para avaliar, investigar e, eventualmente, punir quem "rouba" num sentido estrito ou lato da palavra. Mas eu percebo, ora se percebo, a intencionalidade daquele discurso que está muito para além do sentido das próprias palavras. No essencial, o que o presidente quer dizer ao imiscuir-se no futebol e nos resultados, é que até no futebol eles roubam a Região. Faz parte da conflitualidade, da existência de um inimigo externo, de uma peça que, pelo interesse que o futebol desperta, se junta a uma outra maior que configura a relação da Região com a República. O futebol é apenas um meio, entre outros, para a conjugação plena do verbo "roubar" em todos os tempos e modos.
Mas mais do que isso, o que profundamente lamento, é a disparidade entre o que a Escola tenta incutir nos jovens em contraponto ao discurso político. Quantas vezes e ao longo de tantos anos de docência tentei educar no sentido contrário ao das palavras do presidente, quantas? Em vão, talvez não! Quantas vezes lhes falei de um desporto entendido como bem cultural, de competir com e não contra, de um desporto para a vida, enfim, de um desporto feito à medida de cada um e em que cada um se sentisse bem dentro da sua pele, na feliz expressão de Christian Poccielo. Em vão, talvez não, repito. Todavia, há um claro desencontro entre a Escola e a práxis política. E esse desencontro é lamentável e reprovável, sobretudo porque ajuda a que se mantenha o círculo vicioso de uma luta que nada tem a ver com os valores que deveriam ser incutidos na população de uma Região pobre e dependente, para a qual o desporto deveria constituir um meio e não um fim em sim mesmo. Meio de educação, obviamente.
Foto: Google Imagens.

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