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segunda-feira, 1 de março de 2010

SITUAÇÃO DRAMÁTICA NA MADEIRA (XII)

Quando há dezenas de mortos, não me passa pela cabeça que tudo isto passe sem uma avaliação de responsabilidades.

É tempo de apuramento de responsabilidades. O que aconteceu, mesmo considerando a inevitabilidade das condições meteorológicas e a consequente dimensão da catástrofe, exige um rigoroso e vasto inquérito que avalie as respectivas causas. Só assim será possível corrigir e projectar o futuro. O que aconteceu não pode nem deve ser reduzido à simplista dimensão de um raro e cíclico fenómeno da natureza e ponto final! Em um prato da balança devem ser colocados os aspectos relacionados com as desfavoráveis condições meteorológicas, mas, do outro, tudo quanto não foi adequadamente concretizado no sentido da minimização das consequências. Parece-me óbvio. E aqui, nesse prato das causas, caem, desde logo, um largo campo de incúrias, onde sobressai o evidentíssimo desrespeito pelo ordenamento territorial. É esse inquérito, realizado por uma equipa independente, que poderá determinar a relevância das responsabilidades políticas e criminais.
Entre muitas sombras deste processo, as vítimas mortais, por exemplo, número que qualquer cidadão tende a desconfiar face à disparidade apresentada, carecem de averiguação isenta em sede própria. Todos temos o direito à verdade. Se houve ou não, melhor, se há ou não responsabilidade criminal, isso é da competência dos Tribunais. O que não me parece lógico nem defensável numa sociedade que se dê ao respeito, é que se faça uma autópsia, se proceda a um funeral, a umas quantas Missas e tudo fique por aí. Alto e parem o baile, pois quando um cidadão, ao volante da sua viatura, cai num buraco por ausência da tampa de saneamento básico, reclama os seus direitos à autarquia e é indemnizado após verificação da culpa. Quando há dezenas de mortos não me passa pela cabeça que tudo isto passe sem qualquer avaliação das responsabilidades, tampouco posso aceitar a secundarização de tanta gente que ficou sem nada, arruinada no seu património e na sua vida pessoal aos mais diversos níveis. Ora, isto está muito para além da criação de um "gabinete de apoio às vítimas".É tempo de apuramento de responsabilidades, repito. Em qualquer sociedade com plena consciência dos seus direitos, um quadro destes não pode nem deve ficar circunscrito àquilo que meia-dúzia de políticos debitam, passando como gato sobre brasas, tentando fazer crer a sua total ausência de responsabilidades. Elas devem ser inquiridas e avaliadas. Constitui um dever e um direito.
Mais, ainda. O tempo sendo de apuramento de responsabilidades não pode também servir para o poder (seja ele qual for) renascer das cinzas políticas em que se arrasta. Um poder que andava e anda pelas vias da amargura, desgastado por trinta e tal anos de aventureirismo, não pode servir-se da tragédia para perpectuar a lógica de "com milhões faço inaugurações e com inaugurações ganho eleições", de resto, lema que sempre caracterizou a governação na Região. E neste quadro, o momento é demasiado sério e complexo para atirar para o ar e sem fundamento, que isto vai custar mil milhões e, segundos depois, a parada subir aos mil e quinhentos milhões, quando somados os valores anunciados pelas diversas Câmaras a disparidade do somatório é evidente.
A Madeira tem de ser rapidamente reconstruída nas zonas afectadas, os empresários devem ser acautelados, os que tudo perderam devem ser defendidos, as famílias que perderam entes devem ser olhadas com dignidade e responsabilidade, a oportunidade deve ser aproveitada para requalificar e influenciar o ordenamento do território e, portanto, temos aqui um quadro muito crítico que exige seriedade e comunhão de esforços entre todos. E quando sublinho todos, estou a referir-me aos governos da república e regional, aos técnicos, aos investigadores e ao sector empresarial, entre outros, naturalmente. Sobre esta matéria, muito há para dizer. Ficará para depois. De uma coisa ninguém deve prescindir: é que, seja qual for a solução encontrada, há uma absoluta necessidade de criar uma comissão multidisciplinar de acompanhamento. Se tal não acontecer continuará o regabofe de sempre e até o próprio presidente do governo regional já adianta que irá repensar a sua saída em 2011.

4 comentários:

MFerrer disse...

Completamente de acordo.
Nunca haverá uma verdadeira recuperação se não se detiverem a analisar o que estava mal.
É inexplicável a permanente coligação entre a Igreja e o poder actual na Madeira.
Quais serão os interesses comuns?
A consequente "amestração" do povo por via de umas missas de agradecimento a santas de pau que, a terem feito algum milagre, terá sido o de se salvar a si próprias...diz bem da seriedade dos seus organizadores.
Quanto à continuação do AJJ à frente do governo regional...é como as réplicas sísmicas...continuam depois da tragédia!

André Escórcio disse...

Obrigado pelo seu comentário.
Gostei da sua última frase. Trata-se de uma síntese perfeita.

Anónimo disse...

Esta situação faz-me lembrar a crise financeira global em que para a minorar tem-se injectado biliões nos responsáveis pelas mesmas...Aqui vai acontecer o mesmo...

amsf

André Escórcio disse...

Obrigado pela sua reflexão.
Oxalá, a partir da comissão paritária hoje definida, que tudo decorra com exemplar correcção.