Se há madeirenses que continuam com o palito nos dentes e a boca a cheirar a bacalhau, o Senhor Presidente do Governo deve questionar-se sobre o que andou por aqui a fazer durante trinta e tal anos! Não peça responsabilidades à Oposição.
"Gente Trafulha" foi como o Senhor Deputado Medeiros Gaspar (PSD) caracterizou a actuação do grupo parlamentar do PS, na Opinião hoje publicada no DN-M. Umas páginas mais à frente leio o que ontem se passou na Assembleia, com o Senhor Deputado Jaime Ramos (PSD) a classificar a bancada parlamentar do PS de "saloios", "ignorantes" e com nomes que provocam "nojo".
Preocupa-me este rumo político há anos alimentado pela maioria. A forma como dizem e como actuam. A anormalidade discursiva tomou o caminho da normalidade. Já ninguém estranha a ofensa, as atitudes rascas, a provocação ordinária e, portanto, tudo, no mínimo, parece ser entendido como fazendo parte da lógica de funcionamento do debate político. Confunde-se a acutilância, a convicção e o vigor que o debate deve conter, com a ordinarice dita, por vezes, em tom baixo mas audível. E tudo isto porquê? Simplesmente porque, no caso presente, o grupo parlamentar do PS sustenta que as actuais e gravosas medidas de austeridade da República não devem ser aplicadas de forma cega na Região Autónoma da Madeira. A AUTONOMIA tem de servir para alguma coisa e, daí, apesar das limitações orçamentais, há que dar sinais que é possível cortar onde não é necessário e aplicar em sectores e áreas de absoluta prioridade. Isto é, a estrada pode esperar, mas a fome não; o estádio de futebol pode aguardar, os cuidados de saúde não; a marina pode ficar para depois, a escola não; o apoio à construção de novos Templos pode ficar em lista de espera, os idosos, o apoio complementar nas pensões e o abono de família não. E por aí fora, meus senhores. Aliás, questiono, se o presidente do governo regional da Madeira é contra as medidas de austeridade, então porque motivo as quer implementadas na Madeira? A resposta é fácil de obter! Mais receitas para obras, mesmo que o Povo passe mal.
Olho em redor e vejo onde pode ser cortado, nos institutos de interesse duvidoso, nas sociedades de desenvolvimento e nas empresas públicas que estão tecnicamente falidas, tanto por onde podem cortar no sentido de provar que a AUTONOMIA vale a pena porque sabe marcar a diferença. É isto que o PS na Madeira defende por respeito à existência de órgãos de governo próprio. Significará isto, "trafulhice", Senhor Deputado Medeiros Gaspar! É tão legítimo o PS assumir, politicamente, este rumo, quanto é legítimo a maioria parlamentar pensar ao contrário, no caso em apreço, que as medidas de austeridade devem ser aplicadas na Madeira de forma cega. Competirá ao Povo decidir, no momento certo, quem tem ou quem tinha razão. Agora, de uma coisa é certa, da minha boca o Senhor Deputado Medeiros Gaspar nunca ouvirá que é um "trafulha", nem o Senhor Jaime Ramos escutará que é um "saloio", um "ignorante" e um político que mete "nojo". Nunca o farei, porque a Democracia tem regras e o respeito, como vulgarmente se diz, é uma coisa muito bonita!
POVO COM PALITO NOS DENTES E BOCA A CHEIRAR A BACALHAU
Ouvi esta expressão da boca do Senhor Presidente do Governo, a propósito da necessidade de operacionalizar uma revisão da Constituição. Falou, assim, como contraponto ao que o Dr. Jorge Sampaio assumiu, no programa Prós e Contras da RTP, a propósito da insistência do líder local numa tal revisão. "Ou mudamos o sistema político do país e é legítimo querermos mudar, ou então se é para ficar tudo na mesma, vamos aguentar uma situação pior, esta é que é a grande questão que eu ponho à minha consciência e ponho à consciência de todos vós” (...) "como viviam as populações antes, a necessidade que havia das pessoas permanentemente emigrarem e agora olhem para o país, principalmente, aqueles que já têm filhos e netos" e "vamos ver daqui a dias que cada família vai ter um jovem ou uma jovem que vai partir para o estrangeiro". Ora, isto para dizer que a Constituição é o mal deste nosso País e, digo eu, do desastre económico-social em que a Madeira se transformou. Do meu ponto de vista, o problema não reside aí. Reside nos políticos, na expressão do Dr. Mário Soares, nos políticos com "p" minúsculo. E neste pressuposto, estou totalmente de acordo com o Jornalista Ricardo Duarte Freitas, do DN-M quando sublinha: "(...) Na verdade, eu não consigo ler nesta proposta de revisão constitucional a consagração das legítimas aspirações do povo madeirense. Nas entrelinhas está, aliás, bem expressa, a ansiosa vontade da maioria que sustenta o Governo Regional a garantir instrumentos que permitam perpetuar o poder dentro do mesmo casulo onde se legisla, se promulga, se executa e se julga. E assim não vamos lá". Excelente síntese.
Se há madeirenses que continuam com o palito nos dentes e a boca a cheirar a bacalhau, o Senhor Presidente do Governo deve questionar-se sobre o que andou por aqui a fazer durante trinta e tal anos! Não peça responsabilidades à Oposição.
Ilustração: Google Imagens.
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