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domingo, 10 de abril de 2011

CONGRESSO DO PS (II)


(...) Esquecem-se que o Mundo está a passar por uma grave crise que a todos atinge, esquecem-se que nenhuma instituição credível internacional foi capaz de a prever, entram em estado de completa amnésia e toca a colocar o acento tónico das críticas em uma só figura: Sócrates, o culpado de todos os males. E pergunto, onde estavam esses comentadores, os economistas, os grandes empresários, os banqueiros, os políticos que passam uma esponja sobre todo o processo, onde estão registadas as suas posições devidamente fundamentadas, muito para além da mera crítica política?



O Congresso do PS já estava marcado muito antes da crise política. Eu penso que veio em boa altura, a menos de dois meses de um importante acto eleitoral, pois permitiu clarificar muita coisa. Não constituiu, apenas, um momento de exaltação e de afirmação do colectivo partidário, mas sobretudo, um momento para trocar por miúdos as razões que levaram à crise política. Já aqui desenvolvi o meu posicionamento sobre esta matéria, o qual não se filia na maioria dos comentadores que oiço, que não só não observam com rigor toda a história deste processo, como influenciam o eleitorado que não é portador de todos os dados contextuais.
Mas, atenção, faço aqui, desde logo, um ponto prévio: sou dos que entendem que para a democracia funcionar em pleno e em defesa dos cidadãos, a manutenção de um partido no poder por mais de oito anos consecutivos não me parece saudável. As curas de oposição são fundamentais, pois é aí que se encontra a inovação, a criatividade, os novos desenhos que reflectem posicionamentos estratégicos portadores de futuro. As longas permanências no poder não são de todo benéficas. Neste momento, não está aqui em causa, o meu ponto de vista, a defesa das minhas convicções partidárias, mas muito mais do que isso. E regresso ao que interessa. Observo comentários enviesados, que não vão a montante, não regressam às causas, não contextualizam, comentários que, facilmente, se esquecem do que foi realizado em muitos sectores, áreas e domínios da governação, facilmente se esquecem das reformas sistémicas que foram operacionalizadas, esquecem-se que o Mundo está a passar por uma grave crise que a todos atinge, esquecem-se que nenhuma instituição credível internacional foi capaz de a prever, entram em estado de completa amnésia e toca a colocar o acento tónico das críticas em uma só figura: Sócrates, o culpado de todos os males. E pergunto, onde estavam esses comentadores, os economistas, os grandes empresários, os banqueiros, os políticos que passam uma esponja sobre todo o processo, onde estão registadas as suas posições devidamente fundamentadas e que devem se situar muito para além da mera crítica política? Onde estavam para equacionar o dilema entre um PEC 4 e um FMI guloso e contrário aos princípios que nortearam a sua criação entre 22 de Julho de 1944 e 27 de Dezembro de 1945, para promover a cooperação monetária internacional e o crescimento equilibrado do comércio internacional? Onde estavam? Não os ouvi a comentar a necessidade de um esforço colectivo nacional para combater os interesses obscuros de uma Europa onde 24 dos 27 países são da direita política e o que isso significa neste contexto, no contexto da política de finanças! Mas, enfim, esse é assunto que lá vai. O problema, agora, é a crise política que temos pela frente e que só se resolve com eleições.
Bem disse o Engº José Sócrates a abrir o Congresso que nestes seis anos de governo já conheceu cinco líderes do PSD e que “isto não vai ficar por aqui”. Acredito. E acredito porque o que verdadeiramente está em causa parece ser, para o PSD, o assalto ao “pote”, como se o exercício da política pudesse ter o significado que aquela palavra arrasta consigo. Quando o que está em causa, e esse é um grande desafio que todo o Portugal tem pela frente, é o que diz respeito às suas contas públicas e um regresso, tão cedo quanto possível, a uma situação de normalidade para todos os cidadãos no quadro do seu bem-estar.O que este Congresso veio dizer a Portugal foi, exactamente, essa denúncia sobre os porquês da crise política. E veio dizer mais, que este não é o momento para “brincadeiras” e jogos de poder, mas de concertação de esforços e de entrega a quem conhece os dossiers e a quem tem melhores relacionamentos na Europa, a responsabilidade de governar. A inexperiência pode-nos ser fatal, porque cada hora pode significar uma eternidade! Este momento é bem diferente de uma situação considerada normal, onde o testemunho do poder é passado sem turbulência. Este é um momento que não admite "estados de graça", é extraordinariamente complexo e isso o eleitorado deverá ter em conta. Ora bem, dir-me-ão, se neste percurso de seis anos, entre o muito que de positivo foi concretizado, muitos aspectos merecem reflexão e até alguma condenação, obviamente que estou de acordo. Eu próprio, neste Congresso, por variadíssimas razões de política nacional e internacional, perante um texto extremamente bem escrito e acutilante, apoiei uma Moção cujo primeiro subscritor foi o Presidente do PS-Madeira. E essa Moção tornou-se importante neste Congresso, porque ali foram equacionados aspectos fulcrais que uma grande parte evita falar. Tão importante, que a Moção foi muito aplaudida e garantiu, em votação dos delegados ao Congresso, o triplo do número de lugares na Comissão Nacional (5 pela Lista A de José Sócrates e 13 pela Lista B de Jacinto Serrão, o que significa que muitos, de Norte a Sul, votaram na lista encabeçada pelo Dr. Jacinto Serrão), órgão mais importante entre congressos. Mas uma coisa é o momento da divergência de opinião, da luta ideológica ou do pensamento estratégico acerca do futuro, outra é a convergência que tem de existir a partir do momento que o Congresso encerrou as suas portas. Agora, é Portugal que está em causa. Agora, é o nosso País que deve constituir o desígnio de todos.
No dia 06 de Junho estará em causa exactamente isso: ou o Povo entrega o País aos que vêem nele um grande “pote” ou entregam-no à experiência, reforçando, concomitantemente, a esquerda política no sentido de combater uma Europa onde, repito, vinte e quatro dos vinte e sete países são liderados por partidos ou coligações de direita. Se olharmos para a História de todo este processo, de toda esta crise, pergunto, quem esteve na sua origem? A esquerda certamente que não foi.
Ilustração: Arquivo próprio.

5 comentários:

Fernando Vouga disse...

Caro amigo

Lamento desapontá-lo mas o mundo não se governa com esquerdas e direitas. Governa-se com competência e seriedade, venha elas donde vierem.
Entristece-me ver um país em que os partidos se continuam teimosamente a comportar como clubes de futebol, onde o importante é ganhar, mesmo com trapaças. Passa-se na República, passa-se aqui na RAM. E não me venha dizer que aqui as coisas vão mal porque o partido daqui é blá blá blá, etc. Enfim, o paleio de sempre.
Sócrates, que não me parece que tenha muitos escrúpulos, provou ser ao mesmo tempo um exímio político e um governante desastrado. Só lhe acontecem azares e nunca tem culpa de nada. Mas não é diferente de Jardim. Vai ver que, se ele voltar ao governo, vai servir-se da crise para justificar toda a sorte de negociatas e de atropelos aos nossos direitos, liberdades e garantias. Vai meter Salazar num bolso. Porque com o velho ditador, pelo menos a sensura e a polícia pol+itica davam a cara... Mal, mas davam. A partir dessa altura, oxalá não aconteça, lá no rectângulo, como se diz aqui, vão passar a olhar com desconfiança o companheiro de viagem, o vizinho, o porteiro.
Eu sei do que estou a falar.

Espaço do João disse...

Meu Caro André.
Segui a par e passo o congresso do PS.
Quando ouço comentários tipo PPC, AJJ, PC, BE entre tantos outros, fico com as orelas a arder de tal forma, que me apetece mergulhar no Oceano.
DEpois de ver um "porco de asas" nada me espanta.
Quande se pede a cabeça do 1º ministro e, do ministro das finanças e, não se pede os intestinos de AJJ,para fazer chouriços, que mais se há-de pedir?
Será que o FMI vai ser mais brando que o PEC IV?
Será que o FMI vai saldar as contas que o GR da Madeira deve às farmácias? Vai devolver o dinheiro que o Dias Loureiro e o Sr. Silva arrecadaram?
Fico sentado para ver. Vou aproveitar para comer amanhã um coelho de churrasco.
Um abraço. J.S.

André Escórcio disse...

Obrigado pelos vossos comentários.
Começo pelo Caríssimo Amigo Fernado Vouga.
Eu compreendo-o relativamente à competência que deve ser o apanágio de quem governa. Quando falo de esquerdas e de direitas é simplesmente no quadro dos princípios e dos valores, fundamentalmente os de natureza social. Apesar de hoje estarmos confrontados com situações onde não se sabe onde termina a direita e começa a esquerda, a verdade é que teimo na definição dessa fronteira. Exemplo: defendo a escola pública e o sistema nacional de saúde, a direita parece dizer que sim, mas não tem essa convicção. Este é um mero exemplo.
Agora, concordo com um aspecto que referiu e que é para mim determinante: a competência, o rigor, a disciplina, a seriedade, a frontalidade, a transparência e racionalidade. Não abdico destes princípios que devem noretar a governação. Quanto ao resto, vamos conversando, porque é bom dialogar com Amigos com profundidade de análise.
Caríssimo João, vamos esperar para ver, sendo certo que aquilo que aqui se passou no último fim de semana, é o estertor de um partido velho e cansado.
Quando ele denuncia que isto não está fácil é porque sente, apesar da máquina que montou, que o plano inclidado não permite regresso.

Fernando Vouga disse...

Caro amigo

Aprecio sinceramente o seu "fair play". Algo que tem feito muita falta neste país.
Quanto às doutrinas partidárias, tudo bem. São modelos que não podem ser esquecidos e que devem servir como eixo de convergência para os simpatizantes ou membros. Mas o que normalmente acontece é que, atingido o poder, são "metidas na gaveta" ou, pior ainda, inteiramente subvertidas como fez José Estaline, o tal dos bigodes.
O que me preocupa é o mal que a partidarite faz na oftalmologia dos partidários. Passam a "ver um largueiro no olho alheio" mas...
Ou será que Jardim e Sócrates são assim tão diferentes?

André Escórcio disse...

Obrigado pelo seu comentário.
Eu designaria, se me permite, não por modelos mas por paradigmas. O modelo é qualquer coisa mais estática, enquanto, como sabe, o paradigma é qualquer coisa pela qual me guio, mas não copio. Portanto, aceito que se verifiquem algumas adaptações ao tempo do nosso tempo, mas há princípios que devem balizar o que identifica uns e outros. É contra essa falta de fronteiras que me insurjo.