É a cultura de cidadania no seu pior. É a desresponsabilização e a ignorância no seu pior...
Exercer um cargo de natureza política, de Secretário Regional, por exemplo, não é a mesma coisa que desempenhar uma qualquer outra função de natureza pública. Há uma grande diferença entre um funcionário público e um cargo por nomeação e de natureza política. O cargo de natureza política não é um emprego. É assim em qualquer parte. O problema é que há gente, habituada ao exercício do poder, que se esquece deste princípio. Tantos anos levam sentados na cadeira e nos corredores do poder que interiorizam e consciencializam que aquele é o seu emprego. Daí não se sentirem responsáveis por nada. Curiosamente, quem assim pensa e actua, enquando decisor político, não satisfeito com o cumprimento menos assertivo de um qualquer funcionário face ao desempenho ou realização de uma tarefa, por ausência de dedicação e zelo, descarrega ou manda descarregar, na avaliação de desempenho do funcionário, essa eventual má conduta profissional. Ora, por maioria de razão, o político, investido em um cargo de alta responsabilidade governativa e do qual decorre o bem-estar e segurança de uma população, deve retirar as ilacções respeitantes face às decisões eventualmente negligentes. É assim, repito, em qualquer parte, no sector público e, inclusive, no sector privado.
Mais. Então não são os políticos que, a todo o momento, reclamam a avaliação dos funcionários e que estabelecem as regras de progressão na carreira? Então, o político, pela especificidade do seu cargo, não tem qualquer legitimidade para sacudir responsabilidades que são suas. Nem pode, por uma questão de princípio, de rigor e de exemplo, dizer que a avaliação se faz no acto eleitoral. Esse pressuposto é por demais redutor e, obviamente, não colhe.
Isto a propósito de ter escutado o Secretário Regional do Equipamento Social dizer que, relativamente às consequências do temporal de 20 de Fevereiro, não se sente culpado de nada e que tem trinta e tal anos de doacção ao serviço público do qual se orgulha. Ridículo. Desde logo, porque enquanto funcionário público, foi pago para cumprir tarefas com dedicação e competência. Enquanto político, morreram 42 pessoas, há especialistas que colocam em causa o ordenamento do território, a canalização das linhas de água, o licenciamento de habitações em zonas de risco, e muito e muito mais, e, politicamente, repito, politicamente, não se sente responsável. Só aqui! Em França, Sarkozy perante o quadro de tragédia que observou, mandou abrir um inquérito circunstanciado e, não me restam quaisquer dúvidas que os responsáveis políticos terão guia de marcha, se já não tiveram. Politicamente é assim. Aqui, não há inquéritos, não se averigua, até para efeitos de reconstrução, e pior, não há consequências, repito, políticas, das eventuais negligências cometidas. Está tudo certo e até a prova dos nove deu que a "conta" está certa! Tinha de estar certa. Ali, frente ao Dolce Vita, por exemplo, nada aconteceu, a culpa foi da natureza e a prova está à vista de todos!
É a nossa cultura democrática e de sistema no seu pior. É a cultura de cidadania no seu pior. É a desresponsabilização e a ignorância no seu pior.
Isto a propósito de ter escutado o Secretário Regional do Equipamento Social dizer que, relativamente às consequências do temporal de 20 de Fevereiro, não se sente culpado de nada e que tem trinta e tal anos de doacção ao serviço público do qual se orgulha. Ridículo. Desde logo, porque enquanto funcionário público, foi pago para cumprir tarefas com dedicação e competência. Enquanto político, morreram 42 pessoas, há especialistas que colocam em causa o ordenamento do território, a canalização das linhas de água, o licenciamento de habitações em zonas de risco, e muito e muito mais, e, politicamente, repito, politicamente, não se sente responsável. Só aqui! Em França, Sarkozy perante o quadro de tragédia que observou, mandou abrir um inquérito circunstanciado e, não me restam quaisquer dúvidas que os responsáveis políticos terão guia de marcha, se já não tiveram. Politicamente é assim. Aqui, não há inquéritos, não se averigua, até para efeitos de reconstrução, e pior, não há consequências, repito, políticas, das eventuais negligências cometidas. Está tudo certo e até a prova dos nove deu que a "conta" está certa! Tinha de estar certa. Ali, frente ao Dolce Vita, por exemplo, nada aconteceu, a culpa foi da natureza e a prova está à vista de todos!
É a nossa cultura democrática e de sistema no seu pior. É a cultura de cidadania no seu pior. É a desresponsabilização e a ignorância no seu pior.
Ilustração: Google Imagens.
4 comentários:
para que é que se vai fazer um inquerito se já todos sabemos que a culpa é do tempo, só do tempo de nada mais que o tempo.
palavra do senhor.
tudo o resto são canalhas abutres e gente sem escrupulos.
No Dolce Vita não morreu ninguém. Não é de bom tom, Sr. Deputado, fazer demagogia neste caso. As mortes aconteceram, na maioria, em zonas e habitações existentes antes do Secretário o ser. E em sítios onde não deveria haver habitações mas não vejo ninguém a se chegar lá e dizer isso a quem lá vive. Nem a apresentar soluções para os tirar de lá. Bem pelo contrário. Pedem-se estradas, veredas, esgotos e água para sutentar essas residências por mais umas dezenas de anos. Ali, nos lugares errados. E não é (só) o Governo e as Câmaras que fazem isso. Bem pelo contrário... não é? São recorrentes as visitas de deputados da oposição aios Domingos a essas zonas, para capitalizar a insatisfação desses moradores por não lhes ser reconhecida a legalidade das construções, acessos, energia, água e comunicações...
Claro que há responsabilidades materiais (isso apurarão as companhias de seguros).
Responsabilidades técnicas (grua caída) e também políticas (autorizações para construções ilegais).
Responsabilidades políticas em decisões que agora se revelaram erradas (estrada nova na Serra de Água que foi engolida).
E, esperamos, que haja responsabilidades nos procedimentos futuros, não construíndo nas zonas onde as águas derão nota de serem suas. Se não todos os dias, de 30 em 30 anos, quando lhe apetecer.
Muito obrigado pelo seu comentário.
Concordo com vários aspectos que equacionou.
O exemplo Dolce Vida, como certamente terá notado, constituiu, apenas, um exemplo da minha parte, de um erro denunciado pelos especialistas. E que foi grave. Esse aspecto evidencia a responsabilidade política pela decisão.
Aquilo que defendo e que há muitos anos luto é por um ordenamento sustentável e por uma cultura de risco que abranja políticos e população em geral. Por isso, não há nenhum registo da minha parte a pedir uma estrada. Pelo contrário. Sempre entendi e defendi que primeiro ordena-se o território, infra-estrutura-se e, só depois, deve surgir a habitação. Discuti muitas vezes com o Dr. Miguel Albuquerque estas situações. Sempre discordei do "incentivo" à construção espontânea, a um fechar de olhos muitas vezes por motivos políticos. E isso sai sempre caro.
Tenho uma idade e uma responsabilidade que me obriga a não fazer demagogia nem aproveitamentos políticos através da desgraça. Mas que há responsabilidades políticas, concordará, certamente, comigo, evidentemente que existem. E essas devem ser apuradas seja lá quem for, socialista, social-democrata ou de qualquer outro posicionamento político.
Uma vez mais obrigado pelo seu sincero comentário.
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