O PCP apresentou esta manhã uma alteração ao Estatuto do Aluno. No essencial, tratou-se de um Projecto que visava substituir a punição (suspensão da frequência da escola) por outras medidas no âmbito de uma educação inclusiva. Na oportunidade apresentei a seguinte intervenção:
Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados,
Este projecto que estamos a debater tem, como facilmente se depreende uma correlação directa com um outro que a seguir se discutirá: o observatório da indisciplina e violência. Talvez fosse preferível discutir, primeiro, o observatório e, depois, o estatuto do aluno.
Esta proposta tem muito que se lhe diga. Trata-se de um tema que não pode ter uma abordagem superficial. Se, por um lado, consideramos, num quadro meramente teórico, entre uma orientação meramente punitiva e um carácter eminentemente pedagógico, responsabilizante e formativo, é evidente que o bom senso aconselhará, no âmbito de uma escola e de uma pedagogia inclusiva a opção pela responsabilização. Digamos que é perfeitamente defensável que a orientação seja no sentido da disciplina conquistada pela compreensão dos alunos.
A punição pela punição e aqui estamos a falar, fundamentalmente, da suspensão da frequência da escola, desde que não enquadrada ou suportada em outros aspectos integradores, pode não constituir a melhor medida. Sabe-se, pela prática, que é assim. Suspende-se, hoje e, amanhã, o visado está a cometer os mesmos erros senão piores na mesma escola.
Por isso, esta matéria é demasiado complexa. É que não estamos a falar de irreverência, muitas vezes própria da idade e que, Senhores Deputados, todos nós cometemos quando pela escola passámos. O que está aqui em causa são actos de indisciplina graves e muito graves e até de violência que colocam em causa a estabilidade do processo ensino-aprendizagem ao nível da sala de aula, a própria estabilidade emocional dos professores, destruição das instalações e até o anormal relacionamento com os colegas.
Por isso, há uma necessidade de encontrar um ponto de equilíbrio entre o desejável e a realidade. E a realidade é complexa, desde logo, porque a Escola é o repositório da desestruturação social, da pobreza, da ausência de valores no seio de muitas famílias, do consumo de álcool, dos canais da toxicodependência e da falta de projecto pessoal. Junta-se a este quadro, espaços escolares com excesso de alunos e turmas com um número de alunos desadequado que não favorecem o processo ensino-aprendizagem.
A própria sociedade, Senhores Deputados, desenvolve uma cultura de violência contrária aos interesses de uma escola de compromisso, de formação, onde todos sintam interesse em participar e se formar. A sociedade não garante essa estabilidade e a decisão política nas várias áreas tem ido, infelizmente, no sentido contrário aos interesses de uma educação inclusiva e de uma disciplina assumida pela compreensão dos vários actores.
E tanto assim é que os próprios recursos, já não digo humanos dos estabelecimentos de ensino, mas os recursos financeiros e materiais, muito escassos, não têm vindo a permitir intervenções sérias no que diz respeito aos planos de actividade, susceptíveis de esbaterem os problemas. Basta que tenhamos em atenção o orçamento regional para a Educação.
Da mesma forma que, e isto ressalta aos olhos de quem está por dentro das escolas, não têm existido preocupações no que diz respeito ao necessário acompanhamento e mediação entre a escola e a família. Os professores acabam por fazer aquilo que podem e que é possível.
Portanto, por um lado, temos escolas com alunos a mais o que as torna ingeríveis e muito pouco controláveis sobretudo pela fragilidade organizacional, por outro, uma ausência de políticas, a montante da escola, capazes de atenuarem os focos de indisciplina e de violência.
O facto de, ainda há poucos dias, a polícia ter realizado uma operação de grande envergadura no bairro da Nazaré, constitui um indício, um conhecimento da fragilidade social que por lá vai e que se repercute, obviamente nos estabelecimentos de ensino. E como na Nazaré, um pouco por todo o Funchal e por toda a Região, a percepção que existe é que temos um tecido social esfarrapado e que urge cuidar não apenas pela repressão mas cuidar das chagas sociais potenciadoras da violência.
Porque este é um processo longo, de efeitos a prazo, estamos certos que bastaria, para já, a reconfiguração da rede escolar, no sentido da limitação do número de alunos por escola, uma diminuição da relação número de alunos por professor, uma diminuição da relação de turmas por professor e, certamente, o quadro dos focos de indisciplina e violência diminuiriam. E diminuiria, certamente, o “bullying”, essa violência verbal e até física, essa pressão feita sobretudo sobre os mais jovens.
Depois, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, não se pode olhar para o sistema educativo dos nossos tempos com a imagem que temos de outros tempos, os tempos do Senhor Reitor. São tempos diferentes que terão de ter respostas diferentes. E isto implica reforçar a autonomia das escolas através do desenvolvimento de um modelo de Direcção e Gestão democrático e favorecedor da participação dos diversos corpos sociais que interagem em ambiente escolar. Mas nada será possível fazer enquanto persistirem, todos os dias, intervenções abusivas por parte do governo que não deixa espaço e capacidade de manobra aos estabelecimentos de ensino.
Essa autonomia, quando bem estruturada e desenvolvida torna-se geradora de projectos ímpares e aglutinadores. O que, porém, temos assistido, é a padronização das escolas numa clara falta de sensibilidade pela diferenciação de comportamentos e de projectos, à qual se junta a diferenciação pedagógica. Querem uniformizar as escolas quando elas são sempre diferentes, relativamente aos alunos, relativamente aos professores e diferentes nos espaços geográficos onde estão sediadas. Tem existido aqui uma clara tendência para impor o pronto-a-vestir quando a riqueza do sistema educativo está na diferença. O sistema educativo, como já aqui disse uma vez, não precisa de pronto-a-vestir mas de alta-costura e por medida.
É essa possibilidade de tornar as escolas diferentes umas das outras, quando acompanhada de meios, que possibilita a criatividade, a busca de soluções para os problemas através de equipas multidisciplinares que, por sua vez vão favorecer as medidas preventivas, melhores apoios educativos, o acompanhamento do percurso escolar dos alunos e a mediação de conflitos.
De resto, nada disto é novo. Há livros, há uma extensa bibliografia que trata destes assuntos. O problema é ter capacidade para operacionalizar uma política que rompa com as rotinas, que dê liberdade às escolas para seguirem os seus caminhos e se envolverem com a sociedade.
Senhor Presidente,
Senhoras e senhores Deputados,
A consagração de uma política de combate à indisciplina e violência escolar, só é possível através de um conjunto de preocupações devidamente articuladas. Essas preocupações exigem um compromisso partilhado que deve envolver toda a sociedade, favorecendo, por aí, o desenvolvimento da consciência social dos cidadãos perante o problema. Há uma absoluta necessidade de co-responsabilizar as famílias ao mesmo tempo que se deve adoptar na escola o desenvolvimento de uma efectiva política favorecedora da fruição da actividade cultural e da prática de actividade física e desportiva, enquanto factores de excelência para a integração, convivência social em contexto de vivência colectiva.
Como já referi este não é um tema simples de equacionar. Tem muitas implicações que devem ser tidas em conta. Ora, a proposta que o PCP aqui nos traz é evidente que evidencia uma grande bondade no sentido da solução do problema. Ninguém poderá colocar em causa que a aplicação de uma medida disciplinar deverá ser adequada aos princípios de integração, sucesso e formação integral do aluno. Mais. Que as medidas disciplinares devem evitar contribuir para novas situações de risco do aluno, antes devem contribuir para a inclusão do aluno na escola. É óbvio que sim, mas do outro lado, também estão em causa os professores e os auxiliares de acção educativa. E devemos ter isso em devida conta. A defesa do aluno e a sua integração, obviamente que sim; mas os docentes e os auxiliares de acção educativa também são merecedores de respeito.
Aliás, sabemos pela prática que há uma crise de autoridade do professor que tem muito a ver com tudo o que dissemos mas também com alguma falta de preparação dos docentes para saberem lidar com os novos quadros que despontam. Isto implica uma maior atenção à formação inicial universitária dos docentes. Portanto, há uma imperiosa necessidade do governo repensar os seus posicionamentos relativamente à questão da indisciplina e da violência no espaço escolar. Porque não apenas existe violência na Escola, mas há também a violência da Escola em múltiplos aspectos.
Não basta inaugurar estabelecimentos de ensino. Essa é a parte mais fácil do processo. O problema é nós sabermos o que fazer com as infra-estruturas; o problema é sabermos como escolarizar mas educando; o problema é ter consciência que uma larga fatia dos que chegam à escola trazem consigo, não apenas a pasta e os livros, mas uma montanha de problemas familiares, económicos e sociais que obrigam o sistema a se organizar face ao caldo cultural assimétrico e complexo.
Esta sociedade é violenta, esta sociedade desenvolve mecanismos de marginalização, diz combater a guetização mas é geradora de guetos pelas desigualdades que ela própria gera. A indisciplina e a violência, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, não serão debeladas enquanto não assistirmos a uma actuação na sua génese. É preciso assumir que deixaram o marfim correr e hoje, deitam as mãos à cabeça, pelos erros cometidos.
É tempo de não ignorar o que se está a passar e que compromete o futuro. Há que actuar antes que seja tarde.
Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados,
Este projecto que estamos a debater tem, como facilmente se depreende uma correlação directa com um outro que a seguir se discutirá: o observatório da indisciplina e violência. Talvez fosse preferível discutir, primeiro, o observatório e, depois, o estatuto do aluno.
Esta proposta tem muito que se lhe diga. Trata-se de um tema que não pode ter uma abordagem superficial. Se, por um lado, consideramos, num quadro meramente teórico, entre uma orientação meramente punitiva e um carácter eminentemente pedagógico, responsabilizante e formativo, é evidente que o bom senso aconselhará, no âmbito de uma escola e de uma pedagogia inclusiva a opção pela responsabilização. Digamos que é perfeitamente defensável que a orientação seja no sentido da disciplina conquistada pela compreensão dos alunos.
A punição pela punição e aqui estamos a falar, fundamentalmente, da suspensão da frequência da escola, desde que não enquadrada ou suportada em outros aspectos integradores, pode não constituir a melhor medida. Sabe-se, pela prática, que é assim. Suspende-se, hoje e, amanhã, o visado está a cometer os mesmos erros senão piores na mesma escola.
Por isso, esta matéria é demasiado complexa. É que não estamos a falar de irreverência, muitas vezes própria da idade e que, Senhores Deputados, todos nós cometemos quando pela escola passámos. O que está aqui em causa são actos de indisciplina graves e muito graves e até de violência que colocam em causa a estabilidade do processo ensino-aprendizagem ao nível da sala de aula, a própria estabilidade emocional dos professores, destruição das instalações e até o anormal relacionamento com os colegas.
Por isso, há uma necessidade de encontrar um ponto de equilíbrio entre o desejável e a realidade. E a realidade é complexa, desde logo, porque a Escola é o repositório da desestruturação social, da pobreza, da ausência de valores no seio de muitas famílias, do consumo de álcool, dos canais da toxicodependência e da falta de projecto pessoal. Junta-se a este quadro, espaços escolares com excesso de alunos e turmas com um número de alunos desadequado que não favorecem o processo ensino-aprendizagem.
A própria sociedade, Senhores Deputados, desenvolve uma cultura de violência contrária aos interesses de uma escola de compromisso, de formação, onde todos sintam interesse em participar e se formar. A sociedade não garante essa estabilidade e a decisão política nas várias áreas tem ido, infelizmente, no sentido contrário aos interesses de uma educação inclusiva e de uma disciplina assumida pela compreensão dos vários actores.
E tanto assim é que os próprios recursos, já não digo humanos dos estabelecimentos de ensino, mas os recursos financeiros e materiais, muito escassos, não têm vindo a permitir intervenções sérias no que diz respeito aos planos de actividade, susceptíveis de esbaterem os problemas. Basta que tenhamos em atenção o orçamento regional para a Educação.
Da mesma forma que, e isto ressalta aos olhos de quem está por dentro das escolas, não têm existido preocupações no que diz respeito ao necessário acompanhamento e mediação entre a escola e a família. Os professores acabam por fazer aquilo que podem e que é possível.
Portanto, por um lado, temos escolas com alunos a mais o que as torna ingeríveis e muito pouco controláveis sobretudo pela fragilidade organizacional, por outro, uma ausência de políticas, a montante da escola, capazes de atenuarem os focos de indisciplina e de violência.
O facto de, ainda há poucos dias, a polícia ter realizado uma operação de grande envergadura no bairro da Nazaré, constitui um indício, um conhecimento da fragilidade social que por lá vai e que se repercute, obviamente nos estabelecimentos de ensino. E como na Nazaré, um pouco por todo o Funchal e por toda a Região, a percepção que existe é que temos um tecido social esfarrapado e que urge cuidar não apenas pela repressão mas cuidar das chagas sociais potenciadoras da violência.
Porque este é um processo longo, de efeitos a prazo, estamos certos que bastaria, para já, a reconfiguração da rede escolar, no sentido da limitação do número de alunos por escola, uma diminuição da relação número de alunos por professor, uma diminuição da relação de turmas por professor e, certamente, o quadro dos focos de indisciplina e violência diminuiriam. E diminuiria, certamente, o “bullying”, essa violência verbal e até física, essa pressão feita sobretudo sobre os mais jovens.
Depois, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, não se pode olhar para o sistema educativo dos nossos tempos com a imagem que temos de outros tempos, os tempos do Senhor Reitor. São tempos diferentes que terão de ter respostas diferentes. E isto implica reforçar a autonomia das escolas através do desenvolvimento de um modelo de Direcção e Gestão democrático e favorecedor da participação dos diversos corpos sociais que interagem em ambiente escolar. Mas nada será possível fazer enquanto persistirem, todos os dias, intervenções abusivas por parte do governo que não deixa espaço e capacidade de manobra aos estabelecimentos de ensino.
Essa autonomia, quando bem estruturada e desenvolvida torna-se geradora de projectos ímpares e aglutinadores. O que, porém, temos assistido, é a padronização das escolas numa clara falta de sensibilidade pela diferenciação de comportamentos e de projectos, à qual se junta a diferenciação pedagógica. Querem uniformizar as escolas quando elas são sempre diferentes, relativamente aos alunos, relativamente aos professores e diferentes nos espaços geográficos onde estão sediadas. Tem existido aqui uma clara tendência para impor o pronto-a-vestir quando a riqueza do sistema educativo está na diferença. O sistema educativo, como já aqui disse uma vez, não precisa de pronto-a-vestir mas de alta-costura e por medida.
É essa possibilidade de tornar as escolas diferentes umas das outras, quando acompanhada de meios, que possibilita a criatividade, a busca de soluções para os problemas através de equipas multidisciplinares que, por sua vez vão favorecer as medidas preventivas, melhores apoios educativos, o acompanhamento do percurso escolar dos alunos e a mediação de conflitos.
De resto, nada disto é novo. Há livros, há uma extensa bibliografia que trata destes assuntos. O problema é ter capacidade para operacionalizar uma política que rompa com as rotinas, que dê liberdade às escolas para seguirem os seus caminhos e se envolverem com a sociedade.
Senhor Presidente,
Senhoras e senhores Deputados,
A consagração de uma política de combate à indisciplina e violência escolar, só é possível através de um conjunto de preocupações devidamente articuladas. Essas preocupações exigem um compromisso partilhado que deve envolver toda a sociedade, favorecendo, por aí, o desenvolvimento da consciência social dos cidadãos perante o problema. Há uma absoluta necessidade de co-responsabilizar as famílias ao mesmo tempo que se deve adoptar na escola o desenvolvimento de uma efectiva política favorecedora da fruição da actividade cultural e da prática de actividade física e desportiva, enquanto factores de excelência para a integração, convivência social em contexto de vivência colectiva.
Como já referi este não é um tema simples de equacionar. Tem muitas implicações que devem ser tidas em conta. Ora, a proposta que o PCP aqui nos traz é evidente que evidencia uma grande bondade no sentido da solução do problema. Ninguém poderá colocar em causa que a aplicação de uma medida disciplinar deverá ser adequada aos princípios de integração, sucesso e formação integral do aluno. Mais. Que as medidas disciplinares devem evitar contribuir para novas situações de risco do aluno, antes devem contribuir para a inclusão do aluno na escola. É óbvio que sim, mas do outro lado, também estão em causa os professores e os auxiliares de acção educativa. E devemos ter isso em devida conta. A defesa do aluno e a sua integração, obviamente que sim; mas os docentes e os auxiliares de acção educativa também são merecedores de respeito.
Aliás, sabemos pela prática que há uma crise de autoridade do professor que tem muito a ver com tudo o que dissemos mas também com alguma falta de preparação dos docentes para saberem lidar com os novos quadros que despontam. Isto implica uma maior atenção à formação inicial universitária dos docentes. Portanto, há uma imperiosa necessidade do governo repensar os seus posicionamentos relativamente à questão da indisciplina e da violência no espaço escolar. Porque não apenas existe violência na Escola, mas há também a violência da Escola em múltiplos aspectos.
Não basta inaugurar estabelecimentos de ensino. Essa é a parte mais fácil do processo. O problema é nós sabermos o que fazer com as infra-estruturas; o problema é sabermos como escolarizar mas educando; o problema é ter consciência que uma larga fatia dos que chegam à escola trazem consigo, não apenas a pasta e os livros, mas uma montanha de problemas familiares, económicos e sociais que obrigam o sistema a se organizar face ao caldo cultural assimétrico e complexo.
Esta sociedade é violenta, esta sociedade desenvolve mecanismos de marginalização, diz combater a guetização mas é geradora de guetos pelas desigualdades que ela própria gera. A indisciplina e a violência, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, não serão debeladas enquanto não assistirmos a uma actuação na sua génese. É preciso assumir que deixaram o marfim correr e hoje, deitam as mãos à cabeça, pelos erros cometidos.
É tempo de não ignorar o que se está a passar e que compromete o futuro. Há que actuar antes que seja tarde.
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