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domingo, 31 de maio de 2009

INDIGENTES

A palavra saiu-lhe exactamente nas escadas da Igreja do Colégio onde vicissitudes da vida conduzem, muitas vezes, que por ali se sentem pobres na esperança que alguma coisita caia das mãos de um santo. "Indigentes" foi a palavra dita referindo-se aos Deputados da Assembleia Legislativa da Madeira. Ora, diz-se indigente aquele que é muito pobre, que vive na extrema pobreza, na penúria, que é miserável e necessita mendigar, pois não pode viver sem recorrer ao auxílio dos outros. Ao falar assim dos Deputados da Assembleia fica justificado porque motivo "o mais importante" lá não comparece, certamente porque são indigentes e deles tem pena, evitando, por isso, quaisquer misturas. O curioso de toda a soberba é que, politicamente, o dito homem, embora dependa dos indigentes parlamentares, conta lá com 33 homens e mulheres da sua própria cor política. Todos indigentes, inclusive aqueles que lhe dão cobertura, que votam favoravelmente os seus projectos, que o aturam, embora alguns, ao virar da esquina, lhe façam o gesto de Bordalo Pinheiro, enfim, até os seus "amigos" são indigentes. Vivem sob a sua protecção! Como parlamentar ouvi, refastelado no sofá, e senti pena. Pena de ser presidido por um indígena, um autóctone, um aborígene em permanente indigestão política, "por velhice, nervosismo, excessos, comoções, ingestão de alimentos (políticos) de má qualidade, provocadoras de náuseas e suores frios" (Lello Universal, pág. 1282). O fatinho e a gravata da Missa do Colégio, momentos depois de bater no peito em acto de contrição pelas indignidades, não evitaram o acto político indigesto, confuso, enfadonho, abstruso e desagradável, perante tantos que amam esta terra e que desejariam que fosse um espaço construído na paz social, na serenidade e no bem-estar para todos.
Mas ele sabe em que região vive e que região construiu. Uma região "pequena, pobre e inculta" parafraseando António Barreto, de gente sem noção dos seus direitos, que apesar de paupérrima tem a bandeira partidária enfiada no topo do zinco ou do casebre e, no quarto, a foto do mentor de tudo isto ao lado de Maria e do Rosário; ele conhece a Igreja submissa, que prega a solidariedade, que abre as portas, é verdade, a muitos que passam fome, mas que, historicamente, não utiliza o púlpito para libertar, não toca o sino da contestação, trata as feridas sociais com pensos rápidos, não prega no âmago das questões, não chama os bois pelo nome, não consegue reagir, atada que está de pés e mãos aos milhões da sua própria sobrevivência.
Uma região onde uns riem perante o desabafo indigente, outros encolhem os ombros porque é a natureza dele, outros tomam um qualquer antiácido pelo enfartamento dos disparates ditos, mas onde ninguém se atreve a dizer basta. Os próprios Deputados, enxovalhados pela designação de indigentes mentais aceitam, serenamente, parecendo ficar com um inchaço na língua pelo efeito secundário do antiácido.
Ninguém dá pelo facto de pertencer ao primeiro órgão de governo próprio da Região ao ser tratado por andrajoso e mendigo do regime democrático. Eu reajo e reagirei sempre porque tenho direito a ser respeitado, pois apesar de não concordar com as orientações políticas vigentes, tenho pelos meus adversários políticos a consideração que a própria vivência democrática, sinónima de respeito, assim exige.
Tratasse ele dos milhares que vivem nas margens da indigência, acabasse com as obras megalómanas, com os compadrios, a falta de seriedade e de honestidade, tratasse ele da cultura deste Povo, do Homem na sua plenitude e hoje, certamente, não teria eu este desabafo que vem do fundo das minhas entranhas. Posted by Picasa
Nota:
Opinião, da minha autoria, publicada na edição de hoje do DN-Madeira.

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