A dois dias do regresso a Belém, esta visita do Senhor Presidente da República à Região Autónoma da Madeira pode ser considerada um desastre político. Já não há volta a dar. O registo da sua presença em tudo me fez lembrar os cerimoniais de outrora de Américo e Gertrudes Tomás, acompanhados da extensa corte da Acção Nacional Popular. Não há diferencas significativas nos discursos, nos louvores, nos banhos de multidão, nas bandeirinhas distribuídas e na incapacidade (intencional) de dar um sinal à população que, de facto, é o presidente de todos os portugueses e um presidente atendo e interventor na solução dos problemas. E se assim observo e escrevo não é pelo meu posicionamente partidário, mas sobretudo com a preocupação do cidadão que tenta se manter esclarecido.
O quadro político, económico, social e, naturalmente, cultural é muito preocupante. Os indicadores gerais e específicos em múltiplas áreas da governação exigiam a presença de um Presidente a meter o nariz no laranjal e a cheirar esta fruta aparentemente saudável por fora mas corroída e podre por dentro. Com o seu comportamento percebo, agora, o verdadeiro significado da expressão "cooperação estratégica". Lá, coopera, com o PS, de acordo com os seus interesses de recandidatura; aqui, coopera com o PSD, na esperança de não sofrer os efeitos dos ataques políticos do Presidente do Governo Regional. Os problemas ficam para depois.
E sendo assim, entendo que esta visita acabou por ser desprestigiante para o primeiro Órgão de Soberania, uma vez que se exige muito mais do Presidente da República. Não se trata de tomar partido, de posicionar-se em função do quadro político regional e das tensas relações entre o poder e a oposição, mas de ouvir, interpretar e dar sinais à sociedade que está atento e preocupado face aos gravosos indicadores que colocam a Região à beira do colapso. Não há exagero da minha parte quando aplico a palavra colapso. O problema é, de facto, grave e o governo sabe-o bem. Apenas está a adiá-lo e, neste pressuposto, o Senhor Presidente da República, ao sacudir as responsabilidades, torna-se, a partir deste momento, cúmplice da situação. Sinceramente, não sei que magistratura de influência poderá exercer, que preocupações poderá apresentar ao Primeiro-Ministro nas habituais reuniões semanais, que influência poderá ter junto do Presidente do Governo Regional, quando a sua passagem pela Madeira se resumiu ao silêncio sobre os problemas que a todos afecta, quando o que fica para a História são os almoços e jantares, os discursos de circunstância, uma fuga à sessão solene na Assembleia, visitas turísticas guiadas e muitos aplausos e salamaleques à sua passagem. É caso para dizer que, não o rei, mas o Presidente vai nú. Era melhor que não tivesse vindo. Pelo futuro desta Região, os madeirenses precisavam de uma postura política e não turística.
Apenas uma nota final relativamente ao trabalho da oposição e aquela de terem apostar no futuro, preparando políticos para substituir as gerações que vão acabando a carreira. Se o Presidente disse isto aos representantes dos partidos, apenas demonstrou que desconhece, completamente, o quadro e a monumental teia de interesses e de pequenos e subservientes poderes caracterizadores da Madeira política. E se conhece não foi sério. Como não considero ter sido um deslize ter dito ao Presidente do Governo Regional: «(...) no seu próximo mandato virei aqui dar conta da plantação que irei fazer com as sementes que levo daqui, da Laurissilva».
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