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quarta-feira, 30 de abril de 2008

GALOS, GALINHAS E O CERCADO

Vezes sem conta dou comigo a magicar se vale a pena. Invade-me uma sensação de desânimo contrária à minha atitude perante a vida. E cruzo-me com outros que dizem o mesmo, que questionam a lufa-lufa por uma educação melhor, quando olhamos à volta e o registo é o de cada um para seu lado, maquinalmente resolvendo obrigações definidas, todos sem tempo para reflectir, discutir e defender projectos com futuro. Uns, embrulhados e subjugados em resmas legislativas e de telefone em punho para decifração do que a hierarquia quer, outros, rotineiramente, ao toque de uma campainha, a debitar e debitar coisas, muitas vezes desinseridas de escolhas colectivas sobre a construção do futuro comum, como escreveu R. Plant (1992), "sem o sentido da virtude cívica ou da orientação para valores que não tenham unicamente em vista o interesse pessoal e o comportamento do mercado". Diz Rubem Alves, esse notável pedagogo, que é preciso desaprender um certo jeito de ser escola. Como isso, por ora, não acontece, a luta de anos a pugnar pelo debate, por outros olhares e novos comportamentos, naturalmente esmorece. Mas não morre! As velhas e ultrapassadas estruturas conceptuais, organizativas, curriculares e programáticas, por vezes pintadas de fresco, vão cair e os tais que, por aí andam, por conveniência de vida, sentados em empoeiradas secretárias, terão aí consciência do monumental erro estratégico que cometeram. De facto, o actual modelo educativo que o País e a Região seguem está morto. O Professor José Serralheiro, num notável texto publicado no jornal A Página da Educação, concretiza: "(...) frangos e frangas, alguns já com cristas de galo ou idade de galinha, deambulam pelo cercado. De tempos a tempos os criadores enxotam-nos para as "salas de aula". A criação move-se sem interesse. Uma vez empoleirados, manifestam uma apatia e desinteresse mais condizente com o debicar do alimento imprevisto do que com qualquer organização do trabalho. É nesta política de galinheiro que estamos. De galinheiro e não de aviário. As crianças e os jovens, na sua maioria, vão ao cercado para encontrar os parceiros, deambular, cacarejar, mostrar as penas, arrastar a asa, bicando-se uma vez por outra numa assustadora alienação (...)". Ora, os políticos, quais galos e galinhas, empoleirados, de crista bem levantada, deambulam e cacarejam também pelo cercado da Região, incapazes de oferecerem uma nova ordem ao galinheiro. Bem pelo contrário. A prova está no galo de crista maior quando, em Câmara de Lobos, um concelho a braços com problemas múltiplos, tem este diálogo com um franganito que aguardava o Presidente da República:
- Então, tens tido boas notas?
- Não senhor.
- Não? "Tás" desgraçado! Não te importes. Também chumbei três anos e cheguei a Presidente do Governo...
Achando graça, os presentes riram-se. Graça de mau gosto, digo eu. Simplesmente porque com a Educação não se deve gracejar. É um assunto muito sério. Mas quando, dias depois, no decorrer de uma inauguração de uma escola, ouço a mesma personagem falar de "plano de operações", "armada", "contra-ataque", "ataque feroz", levar o adversário a "perder a cabeça", tudo expressões com cheiro a pólvora, muito pouco educativas para uma cerimónia escolar, num tempo que exige combate à indisciplina e violência, uma boa preparação cívica e o fomento do estudo no sentido da preparação para os complexos desafios que aí estão ao virar da esquina, resta-me dizer que não só não dão uma nova ordem ao galinheiro, como não sabem aproveitar os momentos para assumir uma conveniente atitude política e pedagógica. O que fazer? ...
Opinião, da minha autoria, publicada, hoje, no Diário de Notícias da Madeira.

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